A insuportável transparência das coisas


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"Aquilo que não foi, e que esperavam que fosse".

Te vejo, menina, com um olhar perdido, desejando não acreditar em toda a verdade que está te corroendo.
Te vejo, menina, em lugares barulhentos, mas você parece estar distraída a todo esse movimento, deve estar com um pensamento distante.
Sento ao teu lado, te pergunto se está tudo bem, mesmo sabendo qual é a resposta, e você afirma, e sei que mentes pois sua expressão e seu jeito reprimido não me enganam nada.
Eu sei, porque participo deste elenco que participas e sei que um bom ator brinca de enganar em cima do palco.
Você chora ao lembrar-se, esconde o rosto.
Era frio, mas eu não sabia se estava mais gelado no lado de dentro da tua blusa, ou no de fora.
Dentro de ti, esse balde de água fria que te despejaram, fez com que essa chama quente se apagasse, virou cinzas, e você está tentando varrer para o lado de fora do seu coração.
E qual é o nome do espetáculo?
" Amor líquido...

Quando sabemos que ele precisa morrer mas não temos coragem de matá-lo"

(Vivian Fernanda)


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Retiro-me desse lugar antes que eu cause mais danos e quando as coisas ferverem mais ainda, você pode me culpar por tudo isso. Já era uma velha novidade desamarrar os cadarços da língua e falar o que eu bem entendia, mas o que eu não sabia era que pessoas pussuíam sentimentos e que eu, inconveniente e sem notar, cutucava os sentimentos mais profundos delas.
Quando acordei em minha cama, eu tinha tudo, mas eu estava sozinha nessa estrada. Peguei umas das caixinhas que me mandaram escolher e abri, veio cheia de momentos que eu desejei poder mudar, mas já era tarde. Ninguém vive sozinho, e eu precisava mais do que tudo alguém ao meu lado.
Se eu pudesse falar contigo, gostaria que soubesse que estou me sentindo perdida, mas não estou partindo porque temos histórias para descobrir, livros a serem escritos por nós e contos para serem recontados. Foi com você que passei a maior parte da minha vida aprendendo o prazer de viver.

- Para a mulher que pedi perdão.

(Vivian Fernanda)

Sem você


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Quando soube que meu pai morreu na véspera do meu nascimento senti um vazio. Isso me deixou sentindo como se eu não estivesse viva.
Desde que eu nasci minha mãe sente a falta dele, eu sei disso, ela transmite. Eu nunca pude ver o rosto dele, eu nunca pude sair pra jantar fora, ou simplesmente abraçá-lo. Ele morreu. Tiraram de mim a oportunidade de viver com ele.
Abri umas das caixinhas que mamãe escondia no porão e vi algumas fotografias que estavam lá dentro. Haviam várias fotos deles juntos, eles eram tão felizes.
Ainda não consegui entender, parece que estou em um pesadelo, em qual eu queria poder acordar e sentir um alívio por não ser real.
Está ausente teu lugar na mesa, falta tua voz, falta teu vulto.
Queria poder conversar contigo pai, falar de tudo sobre o que me ronda, mas não estas mais aqui. Sem você minha vida é imperfeita.

"Cedo ou tarde a gente vai se encontrar tenho certeza, durma bem melhor" (Nx Zero)

(Vivian Fernanda)

Obs: O marido da amiga da minha mãe foi assassinado esses dias, e essa mulher está grávida, a criança vai nascer daqui a alguns dias, e eu sei como machuca isso tudo que esta acontecendo na vida dela e fiz esse texto pensando nela. Meu vô morreu dia 09 de abril de 2008, e eu sinto uma imensa falta dele, e ontem foi dia nove de abril e fazem dois anos que ele morreu. Por eles dois entrego meu silêncio.

Pontes indestrutíveis (continuação de "A mudança")


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"Porque toda vez que você me segura em seus braços, Eu fico confortável o bastante para sentir o seu calor" (Colbie Caillat)

Dez anos se passaram. Já terminei a faculdade e tenho um emprego. Em uma tarde, no trabalho, andando no corredor da minha empresa recebo uma ligação. Era Clara, e com o decorrer da história, ela começa a falar nos seus "papos furados" novamente. Eu não estava disposta para ouvir, mas permaneci falando com ela.
- Mas você precisa de um namorado, Liz! Sinceramente você está muito ocupada com o trabalho - Clara repetia imensas vezes.
- Eu já disse que eu quero apenas me focar no trabalho, Clara. Se eu já estou cheia de coisas para fazer aqui, imagine se eu tiver um namorado? Não vou ter tempo nem para mim, nem para ele.
- Eu nunca te vi com um namorado, e aposto que você nunca namorou! - ela disse.
- Eu já namorei sim, está bem? - alterei meu tom de voz - Eu... só não quero isso agora! Será que você pode entender?
- Eu sei, mas você pre... ela não conseguiu terminar a frase pois alguém esbarrou em mim, fazendo com que minhas pastas e meu celular caissem no chão.
Abaixei e peguei algumas coisas caidas que ali estavam, levantei e comecei a organizar-las uma a uma. Eu já estava com preguiça de abaixar e catar tudo quando o rapaz abaixou-se e começou a juntar tudo por mim.
- Desculpe - implorava ele - Desculpe mesmo.
- Pare com isso, já passou! A culpa foi minha, eu estava distraída no telefone. Mas você esta me ajudando muito.
Ele se levantou, passando-me o resto das coisas que haviam caído.
- Obrigada. - eu disse.
- Por nada! - ele respondeu.
Então nós olhamos um para o outro. Um silêncio desconfortável invadiu o corredor e resolveu enturmar-se conosco. Não era um tipo de reação que devia ter acontecido, e também não sei como que eu tinha um formato de rosto idêntico ao dele pendurado em minha mente. Eu conhecia ele de algum lugar, só não sei de onde.
- Com essa correria toda eu acabei nem me apresentando. Meu nome é Liz!
Os olhos dele pareceram brilhar quando eu disse meu nome.
- O meu é Lucas.
Acho que ele roubou meu ar. Uma luz se acendeu em mim, e pude ver todo o meu passado em pequenos instantes. Que surpresa agradável, era ele sim, era Lucas.
- Oh meu Deus, não acredito que seja você. Quanto tempo! - eu abracei ele.
- É mesmo. - Ele pareceu lembrar-se de algo, olhou o relógio e deu um suspiro longo. - Liz, desculpa, eu tenho que ir. - Ele virou-se para saída, mas depois voltou a me olhar. - Eu adoraria jantar com você hoje. Aceita?
- Claro. - respondi.
Contive minha emoção. Tudo que consegui falar naquele momento foi um simples "Claro". Na realidade eu queria poder dizer mais do que isso.
O horário do jantar chegou. Ele me levou em um restaurante incrível. Sentamos e começamos a conversar sobre tudo, em poucos minutos eu já sabia tudo sobre ele, família, amigos, tudo!
Já estava tarde e amanhã eu tenho que acordar cedo, achei melhor eu ir.
- Desculpe-me. - disse, levantando-me da cadeira. - Tenho que ir.
Virei-me e comecei a caminhar até o carro. Eu não consegui andar muito quando senti uma mão na minha cintura e ele sussurrando em meu ouvido:
- Lembra daquela promessa que eu te fiz ainda criança? De nunca te esquecer?
Balancei a cabeça afirmativamente ainda de costas para ele.
- Sabe, Liz, eu cumpri.
Um sorriso brotou em meus lábios. Virei-me, olhei no fundo dos seus olhos e disse:
- Sabe Lucas, eu também cumpri a minha. - dizendo isso passei os braços pelo seu pescoço, abraçando-o.
- E... Você é a única com quem eu ficaria até o final. - ele sussurrou
E mais uma vez eu pude sentir seus lábios contra os meus, depois de tanto esperar por esse momento eu pude sentir essa brisa quente queimando dentro de mim novamente.

"
Por isso vou por esta canção no repetir" (Colbie Caillat)

(Vivian Fernanda)

A mudança (continuação de "até logo")


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Sentei-me no banco de trás, virei e mandei um beijo para Clara, que estava na frente de sua casa com a mãe dela. Cochilei no colo do meu irmão mais velho, acordei e já eram quatro horas da tarde. Nós já estávamos chegando na cidade. O cheiro de girassol se aproximava, olhei para a janela e ali estavam. Fechei os olhos e senti. Era tão doce. Era tão belo.

Eu já estava acostumada com mudança mas não gostava muito. Sempre estive envolvida com mudanças de cidade, de casa, de bairro, de escola. Tudo está tão certo, de repente vira uma bagunça. Com o tempo consegui me organizar. Sei que não é nada bom deixar amigos longe, mas eu não tenho escolha, sou menor de idade, e se meus pais querem, tenho que obedecer.

Passaram-se um mês e eu já estava em um colégio novo. Conheci um garoto, Lucas, ele ficou muito próximo de mim em apenas alguns dias, isso era incrível. Nunca aconteceu isso antes. Nunca tive um amigo homem.

E, sim, eu ainda sentia falta de Clara, mas parece que quando estava com ele todos os meus problemas simplesmente sumiam. Era como se ele causasse isso em mim, esse efeito anestesiante, sem dores, preocupações, ou qualquer outra coisa que pudesse me fazer sofrer.

Mas então aconteceu o inevitável, a mudança novamente, e por incrível que pareça é para o mesmo lugar de antes, onde mora Clara. Eu iria revê-la, então porque tanta tristeza dentro de mim?

Engula isso, ordenei a mim mesma, engula essa tristeza. Tudo vai ficar bem. Assim como ficou das outras vezes. Assim como fica sempre.

Cheguei no colégio logo de manhã e fui dar a notícia para ele.

- Eu preciso ir. – Sussurrei, despedindo-me de Lucas.

- Você não pode me deixar sozinho, Liz. – Disse ele, apelando com seus olhos.

- Não posso opinar simplesmente em nada, estou partindo amanhã. – abaixei a cabeça

- Eu sei. É só que... Eu acho que... – disse ele aproximando-se de mim – Eu gosto de você.

O silencio tomou conta do lugar. Pude ouvir sua respiração ofegante. Olhei para ele e tomei coragem para falar o que eu queria ter dito a muito tempo.

- Eu gosto de você também. – respondi encabulada.

Minha boca se tornou um encaixe perfeito à dele. Parados ali nos beijamos. Foi a primeira vez que me senti daquele jeito. E também foi a primeira vez que gostei de mudanças e queria permanecer ali. Mas havia hora marcada para ir embora daquele lugar.

(Vivian Fernanda)

Até logo


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Desci algumas ruas abaixo para poder falar com Clara. Sua mãe estava na frente de casa regando o jardim, então resolvi pedir para chamá-la. Clara se aproximou e me deu um abraço, ela estava aparentemente feliz.
- Vou ter que me mudar daqui! Não é isso que eu queria fazer, mas meus pais conseguiram emprego em outra cidade. Vou ter que ir com eles!
- Logo agora Liz? Você sabe que eu não tenho ninguém pra confiar, você é a minha única amiga!
- Eu sei, eu sei. Mas eu juro que não vai ser por muito tempo. Logo eu voltarei. Não se preocupe pois nossa amizade nunca será apagada!
Clara tentou se manter forte mas no canto do seu olho deslizou uma lágrima. Pude perceber que essa amizade é verdadeira, ela gostava de mim, assim como eu gostava dela!
- Eu estou indo embora daqui a pouco, olhe ali o caminhão da mudança! Ah, e a mamãe está me chamando!
Abracei Clara.
- ESPERE! – disse ela -.
Ela saiu correndo para dentro de sua casa, voltou com uma pulseira colorida e colocou em meu braço.
- Isto é para você. Quando a saudade apertar lembre-se se mim quando você olhar para ela.
- Não é necessário amiga, o que é para ser guardado e lembrado esta em minha mente e no meu coração.
Tentei tira-la do meu pulso e devolvê-la.
- Não, aceite isto como um último presente meu para ti.

- Esta bem. – sorri e logo após me despedi -.
Direcionei-me para o carro, que estava estacionado em frente a minha casa e parti.

(Vivian Fernanda)